No: no quiero nada.
Ya os he dicho que no quiero nada.
¡No me vengas con conclusiones!
La única conclusión es morir.
¡No me traigáis estéticas!
¡No me habléis de moral!
¡Llevaos de aquí la metafísica!
¡No me pregonéis sistemas complejos, no me pongáis en
fila conquistas
de las ciencias (de las ciencias, Dios mío, de las ciencias);
de las ciencias, de las artes, de la civilización moderna!
¿Qué mal he hecho yo a todos los dioses?
Si tienen la verdad, ¡guárdensela!
Soy un técnico, pero tengo técnica sólo dentro de la técnica.
Aparte de esto, estoy loco, y con todo el derecho a estarlo.
Con todo el derecho a estarlo, ¿habéis oído?
¡No me incordiéis más, por el amor de Dios!
¿Me queríais casado, fútil, cotidiano y tributable?
¿O acaso lo contrario? ¿O lo contrario de cualquier cosa?
Si yo fuera otra persona os podría complacer a todos.
Así, tal como soy, ¡tened paciencia!
¡Idos al diablo sin mí,
o dejad que me vaya solo al diablo!
¿Por qué hemos de ir juntos?
¡No me cojáis del brazo!
No me gusta que me cojan del brazo. Quiero estar conmigo
a solas.
Lo repito: ¡conmigo a solas!
¡Ah, qué fastidio querer que sea de compañía!
¡Oh cielo azul –el mismo de mi infancia–,
eterna verdad vacía y perfecta!
¡Oh suave Tajo ancestral y mudo,
pequeña verdad donde el cielo se refleja!
¡Oh pena revisitada, Lisboa de otro tiempo, hoy!
Nada me dais, nada me quitáis, nada sois que yo me sienta.
¡Dejadme en paz! No he de tardar, que yo nunca tardo...
Y mientras tardan el Abismo y el Silencio, ¡quiero estar
conmigo a solas!
Lisbon Revisited (1923)
Não: não quero nada.
Já disse que não quero nada.
Não me venham com conclusões!
A única conclusão é morrer.
Não me tragam estéticas!
Não me falem em moral!
Tirem-me daqui a metafísica!
Não me apregoem sistemas completos, não me enfileirem
conquistas
Das ciências (das ciências, Deus meu, das ciências!) –
Das ciências, das artes, da civilização moderna!
Que mal fiz eu aos deuses todos?
Se têm a verdade, guardem-a!
Sou um técnico, mas tenho técnica só dentro da técnica.
Fora disso sou doido, com todo o direito a sê-lo.
Com todo o direito a sê-lo, ouviram?
Não me macem, por amor de Deus!
Queriam-me casado, fútil, quotidiano e tributável?
Queriam-me o contrário disto, o contrário de qualquer
cousa?
Se eu fosse outra pessoa, fazia-lhes, a todos, a vontade.
Assim, como sou, tenham paciência!
Vão para o diabo sem mim,
Ou deixem-me ir sozinho para o diabo!
Para que haveremos de ir juntos?
Não me peguem no braço!
Não gosto que me peguem no braço. Quero ser sozinho.
Já disse que sou só sozinho!
Ah, que maçada quererem que eu seja de companhia!
Ó céu azul – o mesmo da minha infância –,
Eterna verdade vazia e perfeita!
Ó macio Tejo ancestral e mudo.
Pequena verdade onde o céu se reflecte!
Ó mágoa revisitada, Lisboa de outrora de hoje!
Nada me dais, nada me tirais, nada sois que eu me sinta.
Deixem-me em paz! Não tardo, que eu nunca tardo...
E enquanto tarda o Abismo e o Silêncio quero estar
sozinho!
Fernando Pessoa, "Álvaro de Campos" en Un corazón de nadie. Antología poética (1913-1935) (Barcelona: Galaxia Gutenberg, 2017), 426-31.